Fernando Brant & Milton Nascimento: “Heart is My Master”

Milton Nascimento_1987 album cover for Yauaretê_Jaguar

Milton Nascimento / Fernando Brant

Heart is My Master

.

Heart –

this drum within,

my sincerest friend,

who has given me a love whose

slightest tenderness will reach the Redeemer.

Like a river that runs in me,

it stems from a natural source;

the love that is in me

stems from the road

it designed for me.

.

From knowing me so well,

it takes me through time to see the world;

territories of passion.

Heart teaches me the courage to live;

throws me into the sea of love.

Within these good waters I will learn to sail –

as I am merely a pupil

who shall follow his tutor wherever he may lead.

.

…And my tutor is my heart,

this drum within,

my sincerest friend,

who has given me a love whose

slightest tenderness will reach the Redeemer.

Like a river that runs in me,

it stems from a natural source;

the love that is in me

stems from the road

it designed for me.

.

My tutor is my heart,

this drum within,

my sincerest friend.

Life – and Passion!

. . .

Milton Nascimento / Fernando Brant

Meu Mestre Coraçao

.

Coração
meu tambor do peito, meu amigo cordial
fez de mim um amador
que por um carinho sobe até o Redentor
o rio que corre em mim
vem dessa nascente seu leito natural
o amor que existe em mim
vem desse caminho de vida que ele me traçou
.
Por me saber de cor
me leva no tempo para o mundo conhecer
território da paixão
coração me ensina a coragem de viver
me joga no mar de amar
nessa água boa eu irei navegar
e eu sou um aprendiz
que segue seu mestre aonde ele for
.
E o meu mestre é o meu coração
meu tambor do peito meu amigo cordial
fez de mim um amador
que por um carinho sobe até o Redentor
vem dessa nascente seu leito natural
o amor que existe em mim
vem desse caminho de vida que ele me traçou
.
Meu mestre é o coração
meu tambor do peito, meu amigo cordial
– vida e paixão

. . .

Fernando Brant_Brazilian lyricist_1946 to 2015_Outubro

Fernando Brant (1946-2015) was born in Minas Gerais state in Brazil. He would become well known as a poet, lyricist and journalist. In the 1960s he met singer-songwriter and guitarist Milton Nascimento, who was born in 1942 in Rio de Janeiro, but was raised in Minas Gerais by his adopting parents. The two first collaborated on the 1967 song Travessia (a later English-language version with different lyrics was called Bridges.) Heart is My Master / Meu Mestre Coraçao was featured on Nascimento’s 1987 album Yauaretê (Jaguar).

. . . . .


Erasmo Carlos & Roberto Carlos: “Love to live, or die of love”

Erasmo Carlos_Classicos em vinilErasmo Carlos & Roberto Carlos

Love to Live…

.

Let’s revive our native feelings

Let’s compile all the good moments

And then show the movie around.

.

Let’s keep poison from our wine

Let’s keep the darts from intoxicating

The Blood that strews our ground.

.

At war, but only if

Wars of love

Missiles of flowers, flowers, flowers

And bombs made out of styrofoam.

.

Suddenly – dive into optimism

And swim in the dark waters of the abyss

Avoid that the one be chased by the thousand

We all came from the very same ground

So let’s end the lovelessness…

.

Love to live

Or die in love…

Love to live

Or die in love…

Love to live

Or die in love…

. . .

Erasmo Carlos & Roberto Carlos

Amar pra Viver

.

Vamos reviver nativos sentimentos

Vamos editar os bons momentos

Depois passar o filme por aí

.

Vamos evitar veneno em nosso vinho

Não deixar que as setas se embriaguem

Do Sangue que semeia nosso chão.

.

Guerra mas só se for

Guerras de amor

Mísseis de flores, flores, flores

Bombas de isopor.

.

De repente, mergulhar com otimismo

E nadar nas águas turvas do abismo

Evitar que mais de mil persiga um só

Viemos do mesmo pó

Fim ao desamor.

.

Amar pra viver

Ou morrer de amor…

Amar pra viver

Ou morrer de amor…

Amar pra viver

Ou morrer de amor…

. . .

Erasmo Carlos and Roberto Carlos during the 1960s Jovem Guarda years

Erasmo Carlos and Roberto Carlos during the 1960s Jovem Guarda years

Erasmo Carlos (born Erasmo Esteves in 1941 in Rio de Janeiro) and Roberto Carlos – no relation – (born Roberto Carlos Braga in 1941 in Espíritu Santo state) have been decades-long collaborators in Brazilian music. The two met as teenagers, and early on exchanged the original lyrics for Elvis Presley’s version of Big Mama Thornton’s “Hound Dog”. Roberto was the founder of the Jovem Guarda (Young Guard) pop-rock movement in mid-1960s Brazil – influenced by American rock&roll plus the “British Invasion” – and Erasmo was one of JG’s core members.

Love to Live / Amar pra Viver was featured on Erasmo Carlos’ 1982 album of the same name.

. . . . .


Alberto Henschel: 19th-century Brazilian photographer: Tipos negros / Black Types

Alberto Henschel_from his series Tipos negros or Black Types_Recife, Pernambuco_around 1869

Alberto Henschel_from his series Tipos negros or Black Types_Recife, Pernambuco_around 1869

Alberto Henschel (1827-1882) was a German-born Brazilian photographer from Berlin. An energetic, enterprising businessman, he established photography studios in the cities of Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro and São Paulo. While known as both a landscape photographer and, for some time Photographo da Casa Imperial (Photographer of the Royal House) during the reign of Pedro II, his main legacy has been his visual record of the social classes of Brazil. His portraits were often produced in the ‘carte de visite’ format, and included the nobility, wealthy tradesmen, the middle class and, most interestingly, Brazil’s black people – whether slaves or freemen/women. These portraits were taken during the decades before the Lei Áurea, the slavery-abolition law of 1888.
.
Alberto Henschel (Berlim, 1827 – Rio de Janeiro, 1882) foi um fotógrafo teuto-brasileiro, considerado o mais diligente empresário da fotografia no Brasil do século XIX. Sua principal contribuição à história
da fotografia no Brasil foi o registro fotográfico de todos os extratos sociais do Brasil oitocentista: retratos, geralmente no padrão carte-de-visite, foram tirados da nobreza, dos ricos comerciantes, da classe média e, mas certamente, dos negros – tantos livres como escravos (em um período ainda anterior à Lei Áurea.

.

Alberto Henschel_ portrait from his Black Types series_Bahia, Brazil_around 1869

Alberto Henschel_ portrait from his Black Types series_Bahia, Brazil_around 1869

Alberto Henschel_Moça cafusa (Girl of mixed Negro and Indian blood)_Pernambuco_1869

Alberto Henschel_Moça cafusa (Girl of mixed Negro and Indian blood)_Pernambuco_1869

Alberto Henschel_Retrato cafusa_1869

Alberto Henschel_Retrato cafusa_1869

Alberto Henschel_retrato da negra de Pernambuco_1869

Alberto Henschel_retrato da negra de Pernambuco_1869

Alberto Henschel_uma negra de Pernambuco_1869

Alberto Henschel_uma negra de Pernambuco_1869

Alberto Henschel_Negra de Pernambuco_1869Alberto Henschel_Negra de Pernambuco_Brasil_1869Alberto Henschel_Negra de Bahia_1869

Alberto Henschel_Negra com criança na Bahia_c. 1869_Salvador, Bahia

Alberto Henschel_Negra com criança na Bahia_c. 1869_Salvador, Bahia

Alberto Henschel_Retrato negro_1869Alberto Henschel_1869_Retratos_Tipos negrosAlberto Henschel_portrait from Black Types_around 1869 in Brazil

Alberto Henschel_portrait of a middle-aged man with hat_from the series Tipos negros_around 1869

Alberto Henschel_portrait of a middle-aged man with hat_from the series Tipos negros_around 1869

Alberto Henschel_Retratos_Tipos negros_Recife_1869

. . . . .


Brazilian Women Poets (Cadernos Negros / “Black Notebooks”, 1997): new translations from the Portuguese: Rufino, da Silva, Evaristo, Ribeiro, Vieira, Alves, Fátima, Tadeu

Steadfast and Strong_collage by Brazilian artist Ananda Nahu

Steadfast and Strong_collage by Brazilian artist Ananda Nahu

.
Alzira Rufino (born 1949, Santos, São Paulo state)
POLICE REPORT
.
The black woman is not stopped
by this brutish thing
by this lukewarm discrimination
your strength is a secret
show your speech through your pores
your scream will echo in the city
they weed your dignity
as poisonous weeds
they hurt you with arrows commended
they experiment on you
your négritude – Blackness –
disturbs,
your whirlpool of forces drowns all around it
they don’t want your presence
they cross your name with absence
come, black woman,
be, black woman,
see, black woman –
after the storm

. . .
BOLETIM DE OCORRÊNCIAS
.
Mulher negra não para
por essa coisa bruta
por essa discriminação morna
tua força ainda é segredo
mostra tua fala nos poros
o grito ecoará na cidade
capinam como mato venenoso
a tua dignidade
ferem-te com flechas encomendadas
te fazem alvo de experiências
tua negritude
incomoda
teu redemoinho de forças afoga
não querem a tua presença
riscam teu nome com ausência
mulher negra, chega,
mulher negra, seja,
mulher negra, veja,
depois do temporal
. . .
Ana Célia da Silva (born in Salvador da Bahia)
JOE
(To my father)
.
Down the street
there goes Joe,
sad and tired
Joe’s the people
Joe is Joe
An urn-less fakir
A stage-less actor
A nameless acrobat
There goes Joe
No present
No future
And any past he gets
he tries to forget
At times he cries
He rarely laughs
He always thinks
he’ll leave
as a sad inheritance
for the future
the tightrope
the shack
the empty casserole
and a bread-less family
. . .

(Para meu pai)
.
Descendo a rua
lá vai o Zé,
triste e cansado
ele é o povo
ele é o Zé.
Faquir sem urna,
ator sem palco,
acrobata anônimo,
lá vai o Zé.
Não tem presente,
Não tem futuro,
se tem passado
tenta esquecer.
Às vezes chora,
bem pouco ri,
vive pensando
que vai deixar
de triste herança
para o futuro,
a corda bamba,
o barracão
marmita vazia
e família sem pão.
. . .
Conceição Evaristo (born 1946, Belo Horizonte)
IN WRITING…
.
In writing hunger
With empty-palmed hands
when the hole-stomach
expels famished desires
there is, in this demented movement
the dream-hoping
for any leftovers.
.
In writing cold
with the tip of my bones
caring in my body the tremor
of pain and shelterless-ness
there is, in this tense movement
the warmth-hoping
for any miserable little vest.
.
In writing pain,
alone,
searching for the resonance
of another in me
there is in this constant movement
the illusion-hoping
for our doubled consonance.
.
In writing life
fading and swimming
on departure’s test tube
there is, in this useless movement
the treacherous-hoping
for catching Time
and caressing eternity.
. . .
AO ESCREVER…
.
Ao escrever a fome
com as palmas das mão vazias
quando o buraco-estômago
expele famélicos desejos
há neste demente movimento
o sonho-esperança
de alguma migalha alimento.
.
Ao escrever o frio
com a ponta de meus ossos
e tendo no corpo o tremor
da dor e do desabrigo,
há neste tenso movimento
o calor-esperança
de alguma mísera veste.
.
Ao escrever a dor,
sozinha,
buscando a ressonância
de outro em mim
há neste constante movimento
a ilusão-esperaça
da dupla sonância nossa.
.
Ao escrever a vida
no tubo de ensaio da partida
esmaecida nadando,
há neste inútil movimento
a enganosa-esperança
de laçar o tempo
e afagar o eterno.
. . .
Esmeralda Ribeiro (born 1958, São Paulo)
LOVE’S ENIGMA
.
There is an island
There is ivory
There is an archipelago in me
.
I’m the same actress rehearsing
every day
the same love case
lived by a whisker.
.
Inside me
solitude dressed as a Harlequin
.
I’m that one that although full of bruises
makes her body like cinnamon
perfumed grass
for her negro to sleep
.
Inside me
Illusions drawn with Indian ink
.
I am that woman
trying to wake up sleeping beauties
but, inside, I am a princess
in profound lethargy.
.
Inside me
a warrior’s strength dressed in satin.
.
I am that one who at night
hides as a chameleon
eye’s pearly drops
in warm passion.
.
Inside me
lives at last the enigma of love.
.
I am that one which no verb translates
before the loneliness and the pain,
that one with insane behaviours
That’s me – the eternal
Mary Joanne.
. . .
ENIGMA DO AMOR
.
Há uma ilha
há marfim
há tristes arquipélagos em mim.
.
Sou a mesma atriz que ensaia
todos os dias
o mesmo caso de amor
vivido por um triz.
.
Dentro de mim
solidão vestida de Arlequim.
.
Sou aquela cheia de hematomas,
mas que faz do corpo relva
com aroma de canela
pro seu negro dormir.
.
Dentro de mim
ilusões traçadas à nanquim.
.
Sou aquela mulher
tentando despertar belas adormecidas
mas, no íntimo, sou a princesa
em profunda letargia.
.
Dentro de mim
força guerreira vestida de cetim.

Sou aquela que à noite
esconde como camaleão
gotas de pérolas d’olho
na cálida paixão.
.
Dentro de mim
enfim mora o enigma do amor.
.
Sou aquela que nenhum verbo traduz
diante da solidão e da dor
aquela que tem atitudes insanas
Esta sou eu, a eterna
Maria Joana.
.

Ananda Nahu_Queen

Ananda Nahu_Queen

Lia Vieira (born 1958, Rio de Janeiro)
EAGERNESS
.
In the memory blinks
images of remote times
and recent things
The air is heavy
always has been
There’s hunger in the world outside
There’s no eating.
There’s tiredness in the world here inside
There is big fear
something frightful
As if nothing might
ever sprout again.
There’s something deformed here inside
Madness that explodes
about to crash / soul made of glass
Maybe is the answer I’m waiting for
Maybe is my ego
egocentric, egotistic, which
– throbbing –
is eager for love.
. . .
ÂNSIA
.
Pisca a memória
imagens de tempos remotos
e também de coisas recentes.
O ar está pesado
tem estado
No mundo lá for a há fome.
Não se come.
No mundo cá dentro há cansaço.
Há um medo grande
uma coisa de susto.
Como se fosse acontecer
não brotar nunca mais.
Há algo disforme cá dentro.
Loucura que explode
prestes a estilhaçar / alma de vidro.
Talvez seja a resposta que espero…
Talvez seja apenas meu ego,
egocêntrico, egoísta, que,
latejante …
deseja amor.
. . .
Miriam Alves (born 1952, São Paulo)
INNER LANDSCAPE
.
The night breeds chords
the joyful star turns into a moon
a dream’s sonata rolls along the asphalt
.
A sleeping sky confuses itself
the sun shines over it with
a middle-of-the-night smile
dew splashes on the roofs
.
The sky’s face muddles
half nights, half days
a dawn rises
a playful child is born
wrapped in dawn’s early hours
.
Wake up, day!
There’s eagerness for hope!
. . .
PAISAGEM INTERIOR
.
A madrugada respira acordes
estrela brincalhona enluará
sonata dum sonho rola asfalto
.
O céu todo em sono confunde-se
o sol ilumina-o com
um sorriso madrugada
respinga orvalho nos telhados
.
A face do céu confunde-se
meio em noites, meio em dias
desponta uma autora
nasce uma criança brincalhona
toda envolta em madrugada.
.
Acorda dia!
há fome de esperança!
. . .
Sônia Fátima (born 1951, Araraquara, São Paulo state)
THE IT
.
The night brought me it:
I don’t know if I call it
I don’t know if I contradict it
or if I just don’t care about
the Benedict
. . .
O DITO
.
A noite trouxe-me isto:
não sei se ligo para o dito
não sei se desdigo o dito
ou simplesmente não ligo
para o Benê-dito
. . .
Teresinha Tadeu (born in São Paulo)
STILTS
.
The dirty water grabs you
quietly, falsely, and you don’t even scream
You mix your innocence
with crab feces and mud
.
And you sleep precociously
holding your toy.
Gliding over the water
under the stilts.
.
The sun comes and goes
and doesn’t dry you out
in its foamy sheets
You’re one less to share the bread!
. . .
PALAFITAS
.
A água insalubre te recolhe
quieta, falsa, e tu nem gritas.
Misturas tua alvura
com fezes caranguejo e lama.
.
E dormes precocemente
segurando teu brinquedo.
Deslizando sob as águas
debaixo das palafitas.
.
O sol se vem e se vai
e não te enxuga
no lençol de espumas.
És menos um, na partilha do pão!
. . .

Other Black Brazilian poets featured in Cadernos Negros

https://zocalopoets.com/2014/06/

. . . . .


Melissanthi (Μελισσάνθη): “Satyricon” em português

Ice flower 6_Toronto_January 2016

Melissanthi (~1907-1991, Atenas, Grécia)
Satyricon
.
Perguntaram à baleia
se queria morrer
para transformar-se numa lépida
criatura do ar.
Ela respondeu: “Jamais!”
Queria mesmo era ficar para sempre
na segurança do seu líquido elemento,
uma baleia apenas, nada mais.
“Uma baleia por toda a eternidade! – exclamou alguém.
– Mas isso é monstruoso.
Se ao menos fosse, como eu,
um hipopótamo!”
. . .
Tradução: José Paulo (1986)

. . .

Grego original:

Σατιρικόν

Ρώτησαν τη φάλαινα
αν θα ΄θελε να πεθάνει
και να μεταμορφωθεί
σ΄ ανάλαφρο πλάσμα του αέρα
κι απάντησε· «Όχι, ποτέ!»
Ναι, θα ΄θελε για πάντοτε να μείνει
μέσα στη βεβαιότητα του υγρού στοιχείου
μια φάλαινα και τίποτα άλλο.
«Φάλαινα στην αιωνιότητα! – φώναξε κάποιος –
Μ΄ αυτό είναι μια τερατωδία
Να ΄ταν τουλάχιστον, καθώς εγώ
ένας ιπποπόταμος!»
. . . . .


“Uma perfeita, excepcional e amável existência de girassol!” Uma tradução de Ginsberg por Tomaz Amorim Izabel

Girasoles en la lluvia 3_Toronto_Julio de 2015

Allen Ginsberg (1926-1997)
Sutra do Girassol (1955)
Tradução por Tomaz Amorim Izabel
.
Eu caminhava às margens da doca de latão onde se descarregavam bananas e
me sentei sob a sombra gigante de uma locomotiva da Southern
Pacific para olhar o pôr-do-sol sobre os
morros de casinhas em forma de caixas e chorar.
Jack Kerouac, companhia, sentou-se do meu lado em uma coluna de ferro arrebentada
e enferrujada, pensamos as mesmas coisas
sobre a alma, desolada e azul e de olhos tristes,
cercada pelas raízes de aço cheias de nós das árvores de
maquinaria.
A água oleosa no rio espelhava o céu vermelho, sol
mergulhado no topo dos últimos picos de São Francisco, sem peixe
naquele rio, sem ermitão naqueles montes, apenas nós
olhos marejados e ressaca como velhos vagabundos
na beira do rio, cansados e astutos.
Olhe o Girassol, ele disse, tinha uma sombra cinza
e morta contra o céu, grande como um homem, sentada
seca sobre uma pilha antiga de serragem –
eu corri encantado – era meu primeiro girassol,
memórias de Blake – minhas visões – o Harlem
e Infernos dos rios do leste, pontes retinindo sanduíches
do Joe Greasy, carrinhos de bebês mortos, pneus
carecas esquecidos e não recauchutados, o
poema da beira do rio, camisinhas e vasos, facas
de aço, nada inoxidável, só a nojeira úmida
e os artefatos afiados se afundando no
passado –
e o Girassol cinza se equilibra contra o pôr-do-sol,
desolação que quebra e poeirenta com a fuligem e a fumaça
e a poluição de locomotivas velhas em seu olho –
corola de espinhos embaçados decaídos e quebrados como
uma coroa espancada, sementes caídas de seu rosto,
boca quase desdentada de ar cheio de sol, raios de sol
obliterados em sua cabeça cabeluda como um arame
teia seca de aranha,
folhas esticadas como braços saindo do tronco, gestos
vindos da raiz de serragem, pedaços quebrados de gesso
caídos de galhos negros, uma mosca negra em seu ouvido,
Profana coisa espancada era você, meu girassol, oh
minha alma, eu te amava tanto então!
O lodo não era lodo de gente, mas morte e locomotivas
humanas,
toda aquele vestido de poeira, aquele véu de pele escurecida
em ferrovias, aquela poluição do rosto, aquelas pálpebras de
miséria negra, aquela mão de fuligem ou falo ou protuberância
artificial de algo mais que sujo – industrial –
moderno – toda aquela civilização manchando sua
louca coroa dourada –
e aqueles pensamentos lacrimejantes de morte e insensíveis
e empoeirados olhos e fins e raízes murchas no fundo, na
pilha natal de areia e serragem, notas de dólar
de borracha, pele de maquinaria, as entranhas e interiores
do carro que chora e tosse, as vazias e solitárias
latas com suas línguas enferrujadas, ai, o que
mais posso eu nomear, as cinzas fumadas de algum
charuto de pinto, as bucetas de carrinhos de mão e
os seios leitosos de carros, cus arrombados de cadeiras
e esfíncteres de dínamos – todos estes
emaranhados em suas raízes mumificadas – e você lá
em pé na minha frente durante o pôr-do-sol, toda a sua glória
em sua forma!

Girasoles en la lluvia 5_Julio de 2015Girasoles en la lluvia 2_Toronto_Julio de 2015Girasoles en la lluvia 4_Toronto_Julio de 2015
Uma beleza perfeita de um girassol! Uma perfeita, excepcional
e amável existência de girassol! Um doce olho natural
para a nova lua sensual, acordou vivo e excitado
agarrado na sombra do poente nascente mensal
brisa dourada!
Quantas moscas zumbiram inocente ao redor do seu
lodo enquanto você amaldiçoava os céus das
ferrovias e sua alma floral?
Pobre flor morta? quando você se esqueceu de que era uma
flor? quando você olhou para sua pele e
decidiu que você era uma velha locomotiva suja e impotente?
o fantasma de uma locomotiva? o espectro e
a sombra de uma outrora poderosa locomotiva americana?
Você nunca foi locomotiva alguma, Girassol, você foi um
girassol!
E você locomotiva, você é uma locomotiva, não me
esqueça!
Então eu apanhei o espesso esqueleto do girassol e o enfiei
ao meu lado como um cetro,
e profira o sermão à minha alma, à alma de Jack
também e para qualquer que o ouça,
– Nós não somos nossa pele de lodo, nós não somos nossa pavorosa
desolada enferrujada locomotiva sem imagem, nós somos todos
lindos girassóis dourados por dentro, nós somos abençoados
por nossa própria semente e loiros corpos
completos crescendo tornando-se loucos girassóis
formais e negros no pôr-do-sol, espionados por nossos
olhos sob a sombra da louca locomotiva
beira do rio pôr-do-sol São Francisco tarde montanhosa de latão
vendo tudo sentado.
. . .
http://tomazizabel.blogspot.ca/

. . . . .


Amy Lowell, Charles Cros, João Teixeira: “Lilacs” / “Lilas”

Lilas en Toronto 1_mayo de 2015
Extracto de “Lilas” por Amy Lowell (poetisa estadounidense, 1874-1925)
Versión de Michael Toora (2011)
.
Lilacs / Lilas
False blue, / De un falso azul,
White, / Blancas,
Purple, / Moradas,
Colour of lilac, / De color lila,
You have forgotten your Eastern origin, / Habéis olvidado vuestro origen oriental,
The veiled women with eyes like panthers, / A las mujeres con velo y ojos de pantera,
The swollen, aggressive turbans of jeweled pashas. / A los hinchados y agresivos turbantes de enjoyados pachás.
Now you are a very decent flower,  / Ahora sois una flor muy decente,
A reticent flower, / Una flor reticente,
A curiously clear-cut, candid flower,  / Una flor curiosamente clara y candida,
Standing beside clean doorways, / De pie junto a  portales limpios,
Friendly to a house-cat and a pair of spectacles, / Amiga del gato doméstico, y de un par de anteojos,
Making poetry out of a bit of moonlight / Convirtiendo en poesía un cachito de luz de luna
And a hundred or two sharp blossoms. / Y  cien o doscientos flores estilosas.
Lilas en Toronto 2_mayo de 2015. . .
Charles Cros (poète français, 1842-1888)
Lilas
.
Ma maîtresse me fait des scènes.
Paradis fleuri de lilas
Se viens humer tes odeurs saines.
.
Les moribonds disent : Hélas !
Les vieux disent des mots obscènes
Pour couvrir le bruit de leurs glas.
.
Dans le bois de pins et de chênes
Les obus jettent leurs éclats.
Victoire ? Défaite ? Phalènes.
Pluie améthyste les lilas,
Sans souci d’ambitions vaines,
Offrent aux plus gueux leurs galas.
.
La mer, les montagnes, les plaines,
Tout est oublié. Je suis las,
Las de la bêtise et des haines.
.
Mais mon coeur renaît aux lilas.
. . .
João de Sousa Teixeira (Brasil)
Lilás (2011)
.
Que flor é esta, assim-assim,
com o nome da coloração?
Os lilases deste jardim,
cores ou flores, o que são?
.
Neste enigma aparente
entre o ser e o que assemelha,
as dúvidas ficam p’ra gente
e todo o mel para a abelha…
. . . . .

Lilas en Toronto 3_mayo de 2015

Patti Masterman (contemporary U.S. poet)
The Lilac Tree
.
One day a lavender sheen appeared
Just across the worn out fence,
And thus she met the Lilac bush,
And she was then possessed of it.
.
That fall, at its earthly altar,
She did her sacrifice;
The corpse of hare and linnet,
And the unlucky field mice.
.
Come spring, she reaped the harvest;
The blooms were heavy, strong:
The odour of fresh Lilacs
About the breeze were blown.
.
Twelve years she served the Lilac,
No matter what the weather,
And at its gnarly feet were laid
Remains of bone and feather.
.
The twelfth year came, and she was ill,
She dragged herself beneath its leaves.
That spring was the most splendid yet;
In brilliant blooms, the branches grieved.
.
The Lilac never bloomed again,
It shut its face for fear of sun,
And those who’d thought to steal a bloom
In spring, found always there was none.
. . .
Walt Whitman (1819-1892)
When Lilacs last in the dooryard bloom’d
(Excerpt)
.
Passing the visions, passing the night,
Passing, unloosing the hold of my comrades’ hands,
Passing the song of the hermit bird and the tallying song of my soul,
Victorious song, death’s outlet song, yet varying ever-altering song,
As low and wailing, yet clear the notes, rising and falling, flooding the night,
Sadly sinking and fainting, as warning and warning, and yet again bursting with joy,
Covering the earth and filling the spread of the heaven,
As that powerful psalm in the night I heard from recesses,
Passing, I leave thee lilac with heart-shaped leaves,
I leave thee there in the door-yard, blooming, returning with spring.
. . . . .

Paul Verlaine: “It rains in my heart”

lluvia de abril 2
Paul Verlaine (1844-1916)
Il pleure dans mon coeur
.
Il pleure dans mon coeur
Comme il pleut sur la ville;
Quelle est cette langueur
Qui pénètre mon coeur?
.
Ô bruit doux de la pluie
Par terre et sur les toits!
Pour un coeur qui s’ennuie,
Ô le chant de la pluie!
.
Il pleure sans raison
Dans ce coeur qui s’écoeure.
Quoi! nulle trahison ?…
Ce deuil est sans raison.
.
C’est bien la pire peine
De ne savoir pourquoi
Sans amour et sans haine
Mon coeur a tant de peine!

. . .
Paul Verlaine
Llora en mi corazón
(Traducción del francés al español: Carmen Morales y Claude DuBois)
.
Llora en mi corazón
como llueve en la ciudad;
¿qué languidez es ésa
que penetra en mi corazón?
.
¡Oh, ruido suave de la lluvia
en la tierra y en los tejados!
Para un corazón que se aburre
¡el canto de la lluvia!
.
Llueve sin razón
en este corazón que se revuelve.
¡Qué! ¿Ninguna traición?…
Ese luto es sin razón.
.
¡Es pues la peor pena
no saber por qué,
sin amor y sin odio,
mi corazón siente tanta pena!
. . .
Paul Verlaine
Chora em meu coração
(Tradução de Amélia Pais)
.
Chora em meu coração
Como chove na cidade:
Que lassidão é esta
Que invade meu coração?
.
Oh doce rumor da chuva
Na terra e nos telhados!
Num coração que se enfada
Oh o canto da chuva!
.
Chora sem razão
Neste coração exausto.
O quê! nenhuma traição ?…
Este luto é sem razão.
.
E é bem a dor maior
A de não saber porquê
Sem amor e sem rancor
Meu coração tanto dói!
. . .
Paul Verlaine (1844-1896)
It Rains in My Heart
.
It rains in my heart
As it rains on the town,
What languor so dark
That it soaks to my heart?
.
Oh, sweet sound of the rain
On the earth and the rooves!
For the dull heart again,
Oh, the song of the rain!
.
It rains for no reason
In this heart lacking heart.
What? And no treason?
It’s grief without reason!
.
By far the worst pain,
Without hatred or love,
Yet no way to explain
Why my heart feels such pain!

. . . . .


Sexta-Feira Santa: Poemas

Albrecht Durer_Betende Hände_Praying Hands or Study of the Hands of an Apostle_drawn circa 1508
José Carlos Brandão (Dois Córregos, Brasil, 1947)
Prece
.
Senhor, dai-me paciência para esperar.
Senhor, dai-me o silêncio das esferas
e a música, a inaudível música dos anjos.
Dai-me a palavra para cantar a vossa glória.
Dai-me a luz para ver a vossa face
e espantar-me
e cair por terra.
Dai-me a graça de ver,
refletido no lago do tempo,
o eterno.
. . .
A Sombra Na Montanha
.
Uma sombra cai
sobre a montanha.

É sol onde estou.
Ainda é sol.

Não desça a sombra, Senhor,
antes que eu suba a montanha.
. . .
Sementes
.
O meu pai passeava entre os túmulos
contando a história dos seus mortos,
.
sementes plantadas na terra
para florescer no devido tempo.

Os mortos vieram do passado longínquo
e se plantaram para não mais morrer.
.
Quando chegar a minha hora de ser semente
sei que a terra inteira não me bastará
.
para os frutos da minha ressurreição.
. . .

Amém
.
Ó Deus, quando me criaste um vulcão explodiu.
Os lagos se fizeram lavas e voaram como cisnes rubros.
Eu me julguei um cavalo voando além da terra e do céu.
Eu pensei que sabia todas as respostas.
.
Pensei que podia inundar o deserto com minhas ondas.
O meu mar de soberba era insaciável
Continua insaciável o meu abismo de soberba e molície.
A tua Mãe me pisou a cabeça, eu era a serpente.
.
A tua e minha Mãe me carregou no colo, eu era a criança desprotegida.
Eu era um verme do pó, indigno do perdão, indigno do Pão da tua carne.
O teu Verbo me salva contra qualquer expectativa.
O teu Verbo se ergue contra a minha insignificância e a luz é feita.
.
A tua Luz, ó meu Senhor, o teu Espírito desce contra as trevas da minha alma.
A tua língua de fogo se eleva e a minha alma será salva.
Ó Deus, amém.
.
Espero a condenação com a certeza dos pérfidos.
Espero a condenação: o meu prêmio, o labéu da minha infâmia.
Se queres salvar-me, amém. Ó Deus, amém.
. . .

Other Good Friday poems, in English and Spanish / Outros poemas (em espanhol e inglês):
https://zocalopoets.com/tag/poemas-para-viernes-santo/

. . . . .


Miguel Torga: “Pietà”

Lucas Cranach the Elder_Pietà beneath the Cross_painted circa 1510

Miguel Torga (1907-1995)
Pietà (1939)
.
Vejo-te ainda, Mãe, de olhar parado,
Da pedra e da tristeza, no teu canto,
Comigo ao colo, morto e nu, gelado,
Embrulhado nas dobras do teu manto.
.
Sobre o golpe sem fundo do meu lado
Ia caindo o rio do teu pranto;
E o meu corpo pasmava, amortalhado,
De um rio amargo que adoçava tanto.
.
Depois, a noite de uma outra vida
Veio descendo lenta, apetecida
Pela terra-polar de que me fiz;
.
Mas o teu pranto, pela noite além,
Seiva do mundo, ia caindo, Mãe,
Na sepultura fria da raiz.

. . . . .

A Paixão de Cristo em imagens:

La Pasión de Jesús en imágenes / The Passion in pictures